Professor Sandro Sell
O chamado crime organizado no Brasil é feito pela junção de esforços entre aqueles que não têm nada a perder e aqueles que não têm nada a temer. Os primeiros são representados por indivíduos pobres, que perderam a esperança de serem “alguém” na vida valendo-se apenas de meios honestos. Não possuem educação, nem oportunidade de emprego, mas foram, pelas propagandas da sociedade de consumo, induzidos a sonharem alto. Querem se “dar bem”. E, nas condições em que se encontram, o crime parece-lhes o único atalho possível. Mas esses, por si só não se organizam, se soubessem como fazê-lo, talvez pudessem fundar cooperativas, empresas e, honestamente, ascenderem na vida. Para organiza-los entram em cena os que têm muito a perder, mas nada a temer. São os financistas do crime. Pessoas ricas, que passaram por escolas, sabem montar empresas, recitar os artigos da Constituição e sentem-se “cidadãos do mundo”. Indivíduos que, para maximizarem seus lucros, organizam o grande negócio da nossa época: o tráfico de drogas. Para chefiar a parte sangrenta e suja desse empreendimento, contratam dublês, encarnados em personagens folclóricos como Fernandinho Beira Mar e Marcola, cuja origem miserável e destino provável (prisão e assassinato) já indicam que pertencem ao terceiro escalão do crime: aquele grupo que pode ser facilmente substituído. E será. Quem manda no crime é outro tipo de gente: pessoas que sequer admitem a possibilidade de serem presas e que têm tudo para acreditarem que jamais serão mortas em tocaias. Nada têm a temer. A polícia não entende a complexidade de seus crimes e, então, desloca sua atenção unicamente para os que assaltam de arma em punho. As leis que, podiam pegar-lhes, não o fazem. Diluem sua eficácia no tripé da impunidade de elite: investigações mal feitas, processos penais conduzidos com excesso de garantias individuais e sem à devida atenção proporcional ao interesse público, e a proteção da opinião pública que não vê tais indivíduos como perigosos. Com isso as elites criminosas continuam tranqüilas, na praia, vendo, na primeira página, seus dublês passarem-se por protagonistas.
Para saber mais:
SELL, S.C. Comportamento social e anti-social humano. Florianópolis: Ijuris, 2006.
2 comentários:
É, Sandro... pra dizer que o rei está nu, só em blog mesmo, pois é preciso muita coragem ou um halo bem representativo. Mas que está nu, ah, isso ele está. Parabéns pela iniciativa!
É isso aí, irmão.Podemos até ser chamados de coniventes com a canalha que está aí, mas passar por ingênuo, isso não...
Abraço
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