1.11.06

A vingança dos presos não serve à sociedade

Professor Sandro Sell

A vingança dos presos não serve à sociedade

É de conhecimento geral o destino que, nas prisões brasileiras, é reservado àqueles que cometeram certos crimes infamantes. Criminosos que molestaram sexualmente crianças ou assassinaram sua progenitora estão, amiúde, condenados à morte pelos colegas de prisão. A sociedade chega a dizer que os citados crimes são intoleráveis na “ética dos presos”. Mas tal conclusão deriva de um total desconhecimento do que seja ética e dos reais motivos dessas execuções. Ética não pode ser igualada a um código de vingança. Uma decisão ética é fruto de criteriosa reflexão acerca de como devemos orientar nosso comportamento diante dos outros e da sociedade. Ética é a busca de compatibilizar liberdades, reconhecer igualdades, tolerar diferenças e, por vezes, de impor limites ao agir nosso e alheio. Mas limites razoáveis, proporcionais, reciprocamente válidos. O que esses presos fazem, assassinando seus colegas de crime, é apenas uma forma de dar vazão a sua violência característica e ao remorso que, eventualmente, manifestam pelo desgosto que, eles mesmos, causaram às suas famílias. Seriam esses indivíduos os mais indicados para protegerem a integridade sexual das crianças e das mães de nossa sociedade? Mas - e aí está todo o drama - alguns dirão: “Pelo menos eles dão uma resposta à altura do mal que aqueles criminosos fizeram; se dependesse da lei, não lhes aconteceria nada.” Porém o que é a lei? Em tese, numa democracia, a lei deve refletir o consenso dos cidadãos acerca de como a vida individual e coletiva deve ser regulada. Nossas leis não nos foram dadas por Deus ou pela Natureza. Se desejarmos mudá-las, podemos. Portanto, se não estamos satisfeitos com a resposta que a lei dá a certos crimes, que nos organizemos para mudá-la. Pode levar tempo e o resultado não ser bem o esperado. Mas ainda é melhor do que transferir a atividade de responder a certos comportamentos criminosos a outros criminosos, cuja condição moral os desqualifica para a tarefa. Os chamados “códigos de ética dos presos” nada mais são que a violência vingativa do ambiente carcerário somada à complacência cúmplice de uma parte da sociedade, que prefere delegar tarefas morais aos criminosos a agir como participativos cidadãos.

Fonte:
SELL, S. C. Comportamento social e anti-social humano. Florianópolis: Ijuris, 2006.

2 comentários:

Anônimo disse...

Querido Professor,
estou lendo seu livro!
E adorando, obviamente!
Sinto faltas das suas aulas.
Mas estou matando a saudade com o livro.
Preciso dizer que escreve muito bem?
Acho que você já deve saber disso né? Hehe

Saiu do orkut e nem se despediu... Hm!

Bom, nos esbarramos pela faculdade (alias, faz tempo que a gente nao se esbarra)

Bjos
;)

Gabriela Jacinto disse...

É a velha história da "justiça com as próprias mãos", esse aspecto é muito complexo, pois quem tem o monopólio de punir é o Estado. Vejamos, o ser humano é movido pelo impulso, vingança, etc. E os presos quando cometem determinadas atrocidades (matando um companheiro, que foi preso por estupro por ex.), estão movidos por ódio,pelo mesmo ódio que a sociedade está naquele momento, porém eles tem um diferencial, eles estão mais perto e tem "poder" de fazer o que a sociedade gostaria de fazer, o que caberia ao meu ver era a competencia, ou seja, o Estado, os policiais , delegados, etc, isolar esses que cometem condutas criminosas que "revoltam a sociedade", porém muitas vezes fazem de propósito, colocando esses na mesma celas de outros que os matam, pois os policiais, etc, estão acometidos pelos mesmos sentimentos que a sociedade , ao meu ver isso vira um ciclo vicioso que se repete e não se modifica.
Texto reflexivo. Um abraço.